quinta-feira, julho 23, 2009

recebi estes dias um email de apoio escrito por Claudio Willer, que reproduzirei abaixo. para quem não conhece, Willer além de grande militante no meio literário, com diversas passagens pela UBE (União Brasileira dos Escritores), é um dos grandes poetas beats (e surrealistas) brasileiros, tendo traduzido os livros Uivo e Kaddish, do Ginsberg, e recentemente foi escolhido para escrever o livro sobre a Geração Beat, da coleção Encyclopaedia, da L&PM.

Seguem as palavras de Claudio Willer.

" Re: a repressão à poesia na flip - matéria do jb e posição da curadoria literária da OFF‏
From: Claudio Willer
Sent: Saturday, July 18, 2009 4:17:50 PM
To: lucila nogueira; estudos-contemporaneos; Ovidio Poli Junior; Pedro Tostes

Minha solidariedade aos autores prejudicados e maltratados pela burocracia. Prefeitura de Paraty devia ao menos ter instruído seus fiscais para informarem aos poetas o motivo da proibição.
abraço,
Claudio Willer
cjwiller@uol.com.br
www.revista.agulha.nom.br
www.secrel.com.br/jpoesia/cw.html
www.triplov.com/willer/index.html
www.tvcronopios.com.br/bitniks04/"

quarta-feira, julho 22, 2009

primeiramente queria agradecer a todas as manifestações de apoio recebidas no último mês. a todos que se manifestaram também peço desculpas pelo longo silêncio - além da minha tradicional lentidão com a internet soma-se a minha itinerância em locais não plugados no último mês e também ao meu direito a reflexão sobre o episódio para que as minhas palavras não nos fizessem perder o que temos de mais importante: a razão.

então segue abaixo o meu comentário sobre o (triste) episódio da apreensão de 16 exemplares do meu livro "Descaminhar".


---x---


"Personalidades autoritárias temem que a ameaça não venha das idéias, e sim da emoção. Quem está no poder nunca quer que nós tenhamos sentimentos. O pensamento pode ser controlado e manipulado, mas a emoção é obstinada e imprevisível. Artistas ameaçam a autoridade expondo mentiras e inspirando a paixão pela mudança. É por isso que quando tiranos assumem o poder, seus pelotões de fuzilamento miram no coração do escritor".
(Robert McKee)

Para quem ainda não sabe o episódio:

Na Quinta-Feira, 02/07, estava trabalhando na FLIP, vendendo meu livro Descaminhar, no velho e prazeroso esquema de abordagem direta, olho no olho, mão em mão, quando fui alertado por um fiscal de que a FLIP havia solicitado à Prefeitura de Paraty que não permitisse que ninguém trabalhasse vendendo seus materiais na cidade, mesmo eu sendo um convidado da Off-Flip e mesmo o produto que eu estava ali divulgando sendo algo extremamente pertinente ao momento: um livro. No segundo momento, quando chamado por uma leitora que havia visto anteriormente o livro e estava interessada, fui novamente repreendido pelo fiscal que então tomou uma absurda atitude para o século XXI - Apreendeu os livros, escritos e produzidos por mim mesmo, dos quais eu sou único responsável e proprietario dos direitos autorais, sob o argumento de que eu estava "comercializando produtos sem autorização".

É importante ressaltar que eu em momento algum montei uma banca, uma barraca ou qualquer coisa do tipo - o que descaracterizaria qualquer dano patrimonial a cidade, desculpa oficial que surgiu dias depois da FLIP mas que sequer foi comentada durante a FLIP. Eu estava apenas divulgando de mão em mão, olho no olho, dentro do meu direito de ir e vir e de livre expressão artística. Eu não estava portando logotipo de nenhuma empresa, não estava vinculado a nenhuma instituição ou pessoa juridica e, portanto, esse ato não pode ser caracterizado como "ação comercial". A origem da poesia vem das ruas e praças, onde ela nasceu. No entanto, desde os tempos dos trovadores o artista precisa comer e ter onde dormir e, portanto, faz-se necessário dentro de um trabalho de divulgação a contrapartida financeira.

Diante de tal situação rumamos eu, Berimba de Jesus e Rodrigo Ciriaco para a Off-FLIP, que nos havia convidado, a fim de relatar o episódio. Quando conversamos com o Ovidio, ele nos informou que a FLIP já havia repreendido também algumas meninas que estavam divulgando folhetos da Off-FLIP e demonstrou grande preocupação com o fato. Na mesma tarde Rodrigo comunicou Marcelino Freire do ocorrido e nós também conversamos com a Lia, da Off-FLIP, que também se comprometeu a atuar no sentido de lutar pela liberação do nosso trabalho. Graças a um esforço conjunto de diversas pessoas, que procuraram a direção da FLIP e a imprensa, conseguimos finalmente chegar ao Sr. Didito, que nos informou "que a FLIP não queria ser caracterizada como um evento comercial, que não queriam que virasse uma feira." Explicamos a ele a natureza de nosso trabalho, que não estavamos montando barracas, o que descaracterizaria a "feira", que a literatura de rua é uma tradição antiga no Brasil, que mesmo Manuel Bandeira, homenageado da edição, editava e vendia os próprios livros e, após esta conversa, mesmo com relutância, ele acabou não apenas me autorizando a trabalhar, mas a todos os demais escritores de rua.


---xxx----

O caso é que tal apreensão gera a necessidade de uma reflexão mais ampla sobre o momento cultural que o Brasil vive. Um país que luta para estabelecer uma cultura de leitores não pode abdicar jamais do trabalho dos muitos autores que tomam as ruas para divulgar a literatura. Estas pessoas, de vidas dificeis e que lutam para sobreviver com um minimo de dignidade, dedicam suas mais nobres e vitais energias para ultrapassar as dificeis barreiras impostas entre um autor e seu público. Ninguém fica milionário com isso (muito pelo contrário) e, na verdade, a maior parte dos autores de rua trabalham de segunda a segunda, faça chuva ou faça sol, e ainda por cima sofrem com a pecha de "vagabundos" e com um preconceito cada vez maior, inclusive do meio literário. Como se fossem uma espécie de "sub-literatura". O que, na verdade, esconde um argumento implicito de que só é "boa literatura" aquela literatura que é chancelada pelos meios oficiais. Se você não passou por um crivo editorial, se não tem um respaldo acadêmico, você passa a ser tachado como um "artista menor".

Esse preconceito chancela atitudes autoritárias como a que ocorreu na FLIP, como se o autor que vende o seu livro na rua fosse um mero camelô, vendendo produtos contrabandeados sem recolhimento de impostos. Não é. Um autor que está divulgando sua obra tem um carater diferenciado por alguns motivos. Primeiro: é dono da obra em questão, seu único responsável e detentor dos direitos autorais. Segundo: seu "produto" foi produzido por ele, não foi tomado de ninguém e, portanto, é perfeitamente legítimo que ele possa comercializá-lo. Terceiro: o livro é um produto isento de tributação e, assim, quando ele faz sua venda olho-no-olho não está sonegando nenhum imposto. Quarto: a venda deste "produto" extremamente específico, de valor cultural, pode ser classificado como direito de expressão artística. Pois, quando o artista se depara com as MUITAS barreiras existentes entre ele e o público (que julgo desnecessário citar, pois creio que quase todos sabem das dificuldades de ser publicado e chegar às livrarias no Brasil), as vezes sua única saída é trabalhar com o relacionamento direto com o leitor. Ou seja, se um autor está na rua vendendo seus livros isto muitas vezes reflete uma falta de opções diante da sua necessidade de se expressar e ser lido. Pode-se até questionar eventualmente este caminho. Mas é indiscutível que é algo que deve ser respeitado.

Assim, vejo como necessário aproveitar esse momento para levarmos a uma reflexão, a fim de que se possa revalorizar esta difícil escola das ruas. Essa escola que olha no olho dos leitores, que percebe suas emoções refletidas nos olhos diante do livro, que masca pedras para cuspir flores. O público é também um validador possível para a literatura, não cabendo apenas aos meios tradicionais o poder de chancelar o que é ou não literatura. Até porque estes meios também são dinâmicos e o que antes era considerado bom pode amanhã ser ruim, ao sabor do gosto ou da teoria do momento. Assim, é legítimo legar ao leitor diretamente o direito de decidir o que lhe agrada ao não, independente de resenhas, indicações ou prêmios. Á Cesar o que é de Cesar.

Agora o que dizer a quem sustenta um evento que toma atitudes que deveriam ser sumariamente rechaçadas? Talvez que, assim, a FLIP NEM PARECE FESTA LITERÁRIA. Que NÃO FOI FEITA PARA VOCÊ e NEM ACREDITA NO MELHOR DO BRASIL. Enfim, é algo para se pensar.

Por favor, se você concordar com estas palavras, passe adiante. Não podemos nos calar diante disso.

Repercussões do Caso: (sabendo de mais alguma, me informe. dados by google)

http://www.ptostes.blogspot.com/
http://www.efeito-colateral.blogspot.com/
http://www.logorreia.com.br/
http://sobrecacosepontes.blogspot.com/
http://berimbadejesus.blogspot.com/
http://bethbraitalvim.blogspot.com/
http://flaviadurante.blogspot.com/
http://chacalog.zip.net/
http://photophophoka.livejournal.com/
http://outubro.blogspot.com/
http://otatubola.blogspot.com/
http://www.ube.org.br/lermais_materias.php?cd_materias=3271
http://www.marmitafilosofica.com/
http://www.ambrosia.com.br/
http://jbonline.terra.com.br/leiajb/noticias/2009/07/07/cultura/poetas_de_rua_barrados_na_festa_dos_livros_em_paraty.asp http://mnocelli.blog.uol.com.br/
http://associaodosblogueirosdesocupados.blogspot.com/
http://lysminhalma.zip.net

Abraços e saud-ações a todos,
Pedro Tostes
ptostes@hotmail.com
http://www.ptostes.blogspot.com/

quarta-feira, outubro 08, 2008

no país das lasanhas congeladas.

dias duros este de selva, duro sobreviver confinado neste meu bunker. as provisões rareiam, andam escassas. no momento a geladeira exala espaços vazios e dentro do armário apenas arroz e uma lata de molho de tomate. isso me obriga a sair da ostra à caça de alimento.confiro o uniforme: camiseta, bermuda, sandálias. meu veículo de muitos cavalos velhos e mancos está pronto para o ataque enquanto eu procuro as chaves. acho e antes de sair confiro se levo comigo a única arma que tenho para esta caçada: o cartão.

enquanto estaciono meu carro na savana-mercado tomo fôlego e me preparo para a dura missão de garantir a sobrevivência. armo-me de um carrinho e entro no antro de onde terei de sair vivo e com o meu combalido saldo bancário ileso. de cara sou jogado na seção das grandes-necessidades-urgentes-que-eu-deveria-possuir. nada que não possa ser superado com um pouco de vontade e uma estratégia de apenas olhar para a frente. saio inteiro mas logo sou ludibriado por uma miragem-oasís, com uma enorme carta de vinhos disponíveis, whiskyes de primeira, tequila, conhaques, cachaças e refrigerantes. mas um olhar atento revelou que nada daquilo era real, eu não tinha muito mais que 20 mangos pra gastar, e que mesmo uma garrafa de coca-cola seria demais. levei dolly.

até aquele ponto eu me saí bem, mas logo eu teria de passar pela terrível seção das porcarias gostosas. doces, isoporitos, biscoitos e laricas afins, terríveis tentações que corroem qualquer orçamento mas especialmente cruéis após um baseado. tenso, eu passava fingindo ignorar a terrível ameaça que me circundava até que fui surpreendido e atacado por uma promoção de biscoito de chocolate vitaminado por apenas 99 centavos. na jugular. enquanto segurava um pacote, precisei de muito esforço para conter a sangria de despesas que seria aquela missão se eu caísse em tentação. mas resisti e continuei focado em minha difícil caçada.

após isso cheguei aos laticínios e cereais, aonde consegui caçar um litro de leite com soda caustica, um saco de farinha de rosca (pra fazer farofa) e feijão. aquilo havia deixado meu saldo bastante exaurido, mas apertei o cinto e consegui chegar até a seção de carnes e congelados. não tinha mais muita munição, portanto precisaria ser certeiro na fase final desta empreitada.

afinal, o paraíso, a área mais aberta de onde se tinha uma ampla visão e espaço para respirar. ouvia o canto das sereias sair de dentro das geladeiras de sorvete ou mesmo de deliciosos queijos caros. distraidamente acabo parando no país das lasanhas congeladas. molho branco. quatro queijos. bolonhesa. vegetariana. presunto e queijo. todas ali, prontas para serem colocadas no microondas ou forno e serem glutonamente devoradas, sem maior esforço. no entanto, logo caio na real e vejo que o preço, sempre ele, se impõe e me veta este delírio consumista. compro meio quilo de carne moída, cebola, alho e pimentão pra fazer um refogado com a lata de molho de tomate e volto ao meu carro e à minha realidade.

domingo, junho 29, 2008

Amor então é?
essa mistura de cheiros e gostos
e gestos e toques e desejos
esse cruzar de pernas que se querem
e esbarrar de bocas que se beijam
em muitos e diversos
ângulos magnéticos

Amor então é?
esse badalar de sinos,
gemer de corpos
contorcionismo e jogar de cabelos
no gozo preciso sobre a paixão do amante
esse querer de novo sempre pedir mais
inventar novas formas de se devorar
e explorar o terreno almejado que é o outro

Amor então é?
o fim disso tudo, suada separação
na entrega suave do abraço
ou mesmo no ir embora
deixando apenas um vazio

(pedro tostes)

sexta-feira, junho 27, 2008

ISSO É UM FATO

na companhia de tolos
nós relaxamos ematerros ordinários,
apreciamos comida ruim,
bebida barata,
conhecemos homens e
mulheres do
inferno.

na companhia de tolos
jogamos os dias fora como
guardanapos de papel.

com essa companhia
nossa música é alta e nosso
riso
falso.

não temos nada a perder
além de nós mesmos.

junte-se a nós
nós somos agora
quase que
todo o
mundo.

Deus nos
abençoe.

(C. Bukowski)

quarta-feira, junho 18, 2008

cicuta

no arroz-feijão
de cada dia

sempre estar de novo
sem sintonia

cada hora passar mais lenta
vertiginosa

as portas se sucederem num labirinto
sem sentido direção

o sol nascer mais tarde nessas manhãs
estranhas do inverno

longas noites fechadas nas paredes camas lençois estrelas
angustiantes

estável desespero respirável ar denso
quase em desconforto
alinhavado nas ranhuras
da alma posta

as pilulas não preenchem
o vazio o estranho o cinzeiro a poeira
que insistem em se esconder
nos cantos do armário
lacrado

tensa retesa verdade
vidro de aquário cárcere
diante do grande público
insistente em aplaudir
enquanto admira vísceras
expostas ao seu deleite
poema

cicuta

sábado, junho 07, 2008

MAIS UM DIA

Deambulo.
Não sei
aonde estou?
quem sou?
Não há nexo.
Descortino.
Nada muda.
Os lugares
iguais.
Escuto música
de ontem.
Sem cores.
Sem luz.
Sentido.
Nem percebi
o sol nasceu.
Ele morreu.
Não consigo
ler jornal.
Tenho medo.
Todo dia.
Acordo, durmo.
Como, bebo,
vivo?
Incerto.
Paradeiro insano.
Não conheço
este lugar.
Minha casa.
Saudade.
Não existe.
Não entendo.
Vida.
Estar?
Eu dobro uma esquina
eu faço um poema.
Eu surto. Eu piro.
Eu sinto coisas
estranhas,

eu sinto.

quarta-feira, junho 04, 2008

SINTONIA PARA PRESSA E PRESSÁGIO

Escrevia no espaço.
Hoje, grafo no tempo,
na pele, na palma, na pétala,
luz do momento.
Sôo na dúvida que separa
o silêncio de quem grita
do escândalo que cala,
no tempo, distância, praça,
que a pausa, asa, leva
para ir do percalço ao espasmo.

Eis a voz, eis o deus, eis a fala,
eis a luz que se acendeu na casa
e não cabe mais na sala.

(Paulo Leminski)

domingo, junho 01, 2008

KY

a vida é dura
não tem caô
e nem ka-ypsilon

segunda-feira, maio 26, 2008

ARRITMIA

não
não bate forte coração
não bate
(porque não há descompasso maior no mundo que pulsar)
não bate forte
coração
dias dias lentos rápidos perco o passo
- e paro -
prossegue a procissão incolume segue pastores
presos na torre
futil escolho cato palavras e conto
me dá um desconto
miserável que sou não me vou sem saber desperdicio
ao certo incerto é o que sei
nada sei
descarto correntezas levo o descaminhar
pare!
hora pra descansar
tarde inutil vadia entregue ao ócio vicio barato
diversão
entretanto luto insone insano contra o tempo
contratempos invento
descarto todo obvio linha reta não apraz
a alma nunca tem paz
a paz não tem alma
nada acalma essa fauna urbana
eu fujo
corro bem longe dentro esse eletrocardiograma por isso
não bate
não bate forte
não bate forte coração não bate meu sopro
coração
para.